Doença de Fabry (e seu acometimento cardíaco)

Doença de Fabry (e seu acometimento cardíaco)

Também chamada de doença de Anderson Fabry é uma desordem do armazenamento mais prevalente no lisossoma humano. Doença genética com erro inato ligado ao cromossoma x, causando alteração no metabolismo dos glicoesfingolipídios, com consequente acumulação de globotriaosilceramide (Gb3) em grande variedade de células do organismo. O derivado hidrofílico do globotriaosilceramide, o deacylated (lyso GB3), possui efeitos citotóxico, proinflamatório e profibrótico.

Prevalência estimada de 1 a cada 50.000 homens, acometendo todos grupos étnicos e raciais. Esta incidência, provavelmente, é subestimada por alguns fatores: 1 – moléstia sem manifestações específicas, 2 – por ser rara, o diagnóstico geralmente não é levado em consideração pelo médico e 3 – pelos erros diagnósticos no início da doença, leva ao atraso diagnóstico de aproximadamente 14 e 16 anos nos homens e mulheres, respectivamente.

O defeito metabólico é a deficiência da hidrolase lisossomal alpha galactosidase A (alfa GalA), que catalisa a clivagem hidrolítica terminal da galactose do globotriaosilceramida (Gb3). Este Gb3 é um intermediário do caminho da degradação do globosídeo, um grande glicoesfingolipídeo presente nas células vermelhas e rins. O globosideo é metabolizado nos lisossomos do baço, fígado e medula óssea. A ausência da atividade da alfa Gal A faz acumular o Gb3 em várias células e tecidos, o que vai ocasionar os sintomas.

O acúmulo é maior no endotélio vascular e células musculares. Este acúmulo e a deposição dos glicoesfingolipídeos nestas células, levam à morte das células musculares lisas, oclusão vascular, isquemia e infartos.

O depósito da substância nos gânglios autonômicos, nos troncos dorsais, nos glomérulos, túbulos e interstícios renais, nas células musculares cardíacas, nas células musculares lisas dos vasos, células endoteliais linfáticas e vasculares da córnea, fibrócitos valvares, fibras cardíacas de condução é o responsável pela miríade de manifestações.

MANIFESTAÇÕES

Existe um largo espectro de manifestação, desde severos acometimentos nos homens como também envolvimento assintomático nas mulheres. 80% dos homens têm manifestações neurológicas, dermatológicas, renal e cardíaca na segunda, terceira e quinta década de vida respectivamente.

As manifestações começam na infância e adolescência, mas se acentuam após os 30 anos:

  • Intensa neuropatia ou dor nos membros (acroparestesias), precipitadas pelo stress, extremo de calor ou frio e atividade física. (75% dos pacientes com 10 anos do início do diagnóstico).
  • Telangiectasias e angioceratomas mais comum em virilha, tronco e área periumbilical. A manifestação dermatológica ocorre em 70% dos pacientes com 17 anos do diagnóstico.
  • Sintomas gastrointestinais como dor, náuseas, vômitos, diarreia ou constipação, ocorrendo de 20 a 70% dos pacientes. Estes causados por depósito do Gb3 nos gânglios autonômicos do intestino e vasos mesentéricos levando à dismotilidade intestinal, disfunção autonômica, vasculopatia, miopatia e sangramento.
  • Opacidade corneana (córnea vorticelada) e também acometimento da retina com aneurismas, dilatação e tortuosidade vascular. Olhos secos são causados pela linfangiectasia subconjuntival.
  • Manifestações renais como proteinúria, poliúria, polidipsia e insuficiência renal inexplicada.
  • Manifestações inespecíficas como calor, frio, intolerância ao exercício e hipo ou hiperidrose e perda auditiva gradual ou súbita.
  • Manifestações neurológicas como AIT, AVEi, e achados de dilatação dos vasos cerebrais.
  • Manifestações inespecíficas como pulmonares (bronquite, chieira ou dispnéia) envolvimento linfático como o linfedema, linfangiectasia subconjuntival, varicosidades, hemorroidas e priapismo, hipotireoidismo subclínico, azoospermia, osteopenia e necrose asséptica óssea, manifestações psicológicas como depressão, ansiedade, fadiga. Acometimento dismórfico facial em lábios, periorbitário, aumento dos lóbulos das orelhas.
    No adulto jovem pode ocorrer acometimento progressivo cardíaco e cerebrovascular e são geralmente a causa do óbito.
  • Envolvimento cardíaco inclui HVE, 1/3 tem acometimento do VD, miocardiopatia hipertrófica, fibrose miocárdica (realce póstero lateral na Ressonância), ICC, ICO, anormalidades valvulares aórticas e mitral e distúrbios da condução bem como arritmias leves ou malignas (PR curto, bloqueio de ramo e bloqueio AV, taquicardia supraventricular, FA e flutter atrial).
    Um em cada 20 pacientes com hipertrofia das paredes do ventrículo esquerdo (HVE) inexplicada poderá ter Doença de Fabry.

SINTOMAS CARDIOVASCULARES

  • Dispnéia, dor torácica, palpitações e tonturas.

SINTOMAS NÃO CARDIOLÓGICOS

  • Perda auditiva progressiva.
  • AIT ou AVC (em jovem sem outras causas).
  • Distúrbio da transpiração (hipo ou hiperidrose) pelo acometimento do sistema nervoso autônomo.
  • Angioceratomas (pequenas lesões de pele avermelhadas).
  • Disfunção renal progressiva e encontro de múltiplos cistos renais e proteinúria inexplicada.
  • Distúrbios gastrointestinal (dor, diarreia e constipação).
  • Neuropatia em mãos e pés (dor e reduzida sensação térmica). A dor na neuropatia é causada com contato com água fria, exercícios, stress, calor, etc.

DIAGNÓSTICO

Pode ser bioquímico e ou teste genético molecular.

O diagnóstico precoce é primordial pois, sem tratamento específico, a expectativa de vida é de aproximadamente 20 anos no homem e 15 anos na mulher. Em média, o diagnóstico definitivo ocorre após 13 anos do início dos sintomas.

Dosagem da atividade da enzima alfa-galactosidase A (alpha-Gal A) nos leucócitos.

Análise de mutação genética (seguindo avaliação de algoritmo) para diagnóstico preciso.

TRATAMENTO

Reposição específica da enzima com uso do Hidroclorito de Migalastat por via oral.

Obs: quando mais precoce o tratamento melhor prognóstico e sobrevida.

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